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Da relação entre programas de cozinha, merenda escolar e longevidade na Itália

Porque a merenda escolar italiana pode salvar vidas?

No Brasil, na Itália e acredito seja uma tendência mundial, o número de programas televisivos dedicados à culinária cresceu exponencialmente nos últimos anos.

Basta ziguezaguear um pouco com o controle remoto para cruzar com aspirantes chefs, confeiteiros improvisados e profissionais que auto declaram-se especialistas em nutrição.

A saúde à mesa passou a ser um tema prioritário na agenda da first lady americana, Michelle Obama, e um cartão de visitas para o famoso chef britânico Jamie Oliver, autor do programa Food Revolution.

Essa overdose de exposição gastronômica, porém, tem o seu lado positivo. Muitas pessoas começaram a interrogar-se sobre o que comem e, principalmente, como comem.

A simbólica horta nos jardins da Casa Branca e a tentativa de revolucionar a qualidade da merenda nas escolas americanas são emblemas desse fenômeno emergente.

Confesso que, desde que mudei para a Itália, a minha consciência sobre regime alimentar mudou radicalmente.

Aqui, a maioria das pessoas costumam ler com atenção a etiqueta de cada alimento, priorizando o consumo daqueles produzidos localmente, simplesmente porque são mais frescos e não poluiram o ambiente porque foram transportados por centenas de quilômetros.

Dicilmente um italiano comprará uma abobrinha no mês de dezembro, porque sabe que essa verdura, típica do verão, seria menos saborosa e possuiria um valor nutricional inferior durante o inverno.

Nas grandes cidades os supermercados ainda representam o principal canal de venda direta de frutas e verduras, mas em localidades menores é comum encontrar famílias que abastecem a geladeira comprando diretamente dos produtores agrícolas.

Não me considero uma “fundamentalista em alimentação” e não acho que tudo qualquer produto rotulado como “orgânico” seja sinônimo de “saudável”.

Os supermercados italianos estão repletos de produtos orgânicos que foram realizados com gorduras de péssima qualidade. Mais uma vez, informação faz a diferença.

Moro na capital italiana, mas também me sirvo de uma cooperativa que entrega, a domicílio, produtos cultivados por agricultores da região do Lácio.

Mesmo depois de anos de debates, a maior parte dos consumidores italianos continuam reticentes com relação ao consumo de alimentos transgênicos.

Durante o ex governo Letta, foi aprovado um decreto que proibe, pelo menos por 18 meses, o cultivo de qualquer tipo de OGM em solo nacional. Além disso, alguns dos principais varejistas europeus adotaram a política de de não vender, sob sua marca própria, qualquer produto que rotulado como transgênico.

Acredito que para a maioria dos italianos, quanto menos manipulado industrialmente for uma alimento, melhor. Na pior das hipóteses, quanto menos ingredientes conter uma etiqueta, melhor. Exemplo: queijo feito com leite cru, coalho e sal. Ponto.

O Brasil, por sua vez, é um dos maiores consumidores mundiais de agrotóxicos.

De acordo com os dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), na safra 2010/2011 o consumo somado de herbicidas, inseticidas e fungicidas, entre outros, chegou a 936 mil toneladas.

O assunto “merenda escolar” é um capítulo a parte. Em geral, as escolas públicas italianas oferecem às crianças um menu bem equilibrado e, nos últimos anos, também aderiram a uma iniciativa que oferece, como lanche para os pequenos, frutas e verduras orgânicas de estação.

No final do ano letivo, cada família recebe um questionário super detalhado que abrange desde os hábitos alimentares das crianças até a opinião sobre esse programa.

Educação alimentar começa em casa e é reforçada na escola. Nenhuma criança acostumada com o sabor distorcido de uma bebida artificial e aromatizada ao morango escolheria, espontaneamente, um copo de leite fresco e morangos para beber. Simplesmente porque o seu paladar já foi “corrompido”.

As crianças italianas não são menos expostas a comerciais de “junk food”, mas na Europa a consciência das empresas a esse respeito está evoluindo.

 

Só para dar uma idéia, 25 grandes nomes da indústria alimentar anunciaram que, a partir de 2018, não farão mais publicidade de alimentos – endereçadas a menores de 12 anos de idade – e que não satisfazem os requisitos nutricionais aprovados pela World Federation of Advertiser.

O Ministero dello Sviluppo Economico também incentiva a mídia a adotar códigos de auto regulamentação em matéria de comerciais de produtos alimentares que tem como publico alvo menores de idade.

Muitos menores italianos correm risco de obesidade, mas acredito que poucos são aqueles que recusariam um prato de espaguete com molho de tomates frescos, e não em lata.

Lembro que, recentemente, a Luciana Misura, do Aprendiz de Viajante, havia comentado que a escola da filha nos Estados Unidos havia preferido muffins comprados prontos em vez de um bolo caseiro preparado por ela mesma para festejar o aniversário da pequena.

Na Itália as escolas preocupam-se com eventuais alergias e intolerâncias, mas a cultura do “home made = alimentos mais saudáveis” ainda impera por aqui.

Me assusta a idéia de ler a etiqueta de um alimento e não distinguir muitos deles.

A expectativa media de vida dos italianos é de 82,6 anos e gusto de acreditar que a alimentação acaba contribuindo com as estatísticas.

Na Sardenha, o número de habitantes que superaram os 100 anos de idade é um dos mais altos do mundo, junto com a ilha de Okinawa, no Japão.

Tenho uma vizinha de 102 anos de idade que ainda tricota diariamente enquanto assiste a televisão. Será um caso?

Acho que não, porque a “dieta mediterranea” foi declarada oficialmente patrimônio cultural imaterial pela Unesco.

 

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