Roma insólita: Sant’Eustachio, a igreja com a cabeça de cervo
Quando você passear pelas ruas de Roma sugiro que você aguce a vista e, se puder, olhe para cima. Só assim você poderá capturar a riqueza de detalhes, as sacadas floridas, as cúpulas monumentais, placas em homenagem a personalidades ou a importantes momentos históricos, nichos com imagens sacras, paredes recobertas de agradecimentos por bênçãos recebidas (per grazia ricevuta) ou algo inesperado.
Para quem gosta de curiosidades, já escrevi o post 10 passeios misteriosos e bizarros em Roma e hoje vou contar mais uma delas. No Rione Sant’Eustachio, aquela área de Roma localizada nos arredores do Panteão e da Basilica di de Santa Maria Sopra Minerva, a maioria dos turistas vaga à procura de um dos melhores espressos da cidade, aquele do Caffè Sant’Eustachio, ou do elefantinho de mármore de Bernini que decora o obelisco na Piazza della Minerva.
Enquanto isso, poucos notam outro animal que se transformou no símbolo do bairro: o cervo. Quando estiver diante da Basilica di S.Eustachio observe o alto de sua fachada barroca. Em vez de um crucifixo, você notará a cabeça de um cervo com uma cruz entre seus chifres; um ícone insólito para uma igreja cristã.
Desde 2016, depois de um apelo do Papa Francisco às necessidades dos mais pobres, essa igreja da capital arrecadou fundos e inaugurou uma estrutura que os romanos chamaram de “Casa da Misericórdia”. Além de oferecer refeições gratuitas aos moradores de rua, a estrutura também oferece aos mais necessitados a possibilidade de usufruir de áreas comuns como banheiros, lavanderia e biblioteca.
A origem desse lugar de culto, no entanto, é ligada a um general romano que se chamava Plácido. Ele prestava serviços ao imperador Trajano na Ásia Menor e um dia, enquanto comandava suas tropas e caçava, foi surpreendido por um cervo. Hábil caçador, ele preparou o arco e a flecha para matar o animal, mas naquele momento notou uma cruz entre os chifres do cervo. Tocado pelo acontecimento, ele e toda a sua família converteram-se ao cristianismo e Plácido passou a adotar o nome grego de Eustachion , cujo significado é “boa sorte”.
Apesar da troca de nome, Eustáquio enfrentou uma série de desventuras depois de ter se convertido. Perdeu seus bens e foi obrigado a fugir para o Egito, onde sua mulher e filhos foram raptados. De acordo com relatos históricos, apesar das dificuldades ele nunca perdeu a própria fé. O sucessor de Trajano, o imperador Adriano, contestou a conversão de Eustáquio e ordenou que ele oferecesse um sacrifício aos deuses de Roma. Eustáquio não aceitou a ordem do imperador e junto com a família foi condenado à morte por suplício dentro de um recipiente de metal incandescente em forma de touro.
Os restos mortais do santo foram conservados em um sarcófago localizado sob o altar maior da basílica romana, enquanto outras relíquias encontram-se na igreja de Saint Eustache, em Paris. No altar da igreja fica uma pintura realizada por Nicola Salvi, o mesmo arquiteto que projetou a Fontana di Trevi, que retrata a dramática cena.