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Brasil e Itália discutem temas fundamentais na Embaixada do Brasil em Roma

Do ponto de vista histórico e político, 2024 é um marco importante para o Brasil e para a Itália. Ambos celebram os 150 anos de imigração italiana no Brasil.

Enquanto a Itália prepara-se para liderar o vértice do G7, que será realizado de 13 a 15 de junho na masseria Borgo Egnazia (Puglia), nosso país – que assumiu a presidência do G20 – será o promotor da Cúpula de Chefes de Governo e Estado prevista entre 18 e 19 de novembro no Rio de Janeiro.

A grande ressonância da forte proximidade e da contaminação cultural entre os dois países é a ocasião para que cada um deles, com racionalidade, “se olhe no espelho” e reconheça qualidades e defeitos de uma identidade híbrida, em contínua transformação.

O Brasil acolhe o maior número de descendentes de italianos fora da Itália (cerca de 30 milhões), enquanto na Itália residem 162 mil brasileiros.

Grande parte dos imigrantes brasileiros que se mudam definitivamente para a Itália esperam encontrar no país sinais de igualde econômica e de direitos, segurança ou instituições responsivas, mas será que nessa relação entre os dois países, só a Itália pode “exportar” boas práticas ou o Brasil também pode ser fonte de inspiração em matéria de políticas públicas e questões sociais?

No último dia 3 de abril, a Embaixada do Brasil em Roma foi palco do primeiro seminário ítalo-brasileiro de políticas públicas, uma iniciativa promovida pelos grupos parlamentares de amizade entre ambos os países que pretende, periodicamente, debater temas relevantes e de interesse comum.

Embaixada do Brasil em Roma

O embaixador do Brasil na Itália, Renato Mosca, inaugurou o evento sublinhando a importância do diálogo para a solução de fenômenos coletivos como os três grandes temas discutidos durante o seminário: violência de gênero, medidas alternativas à prisão e acordos comerciais e legislativos entre os dois países.

Os deputados Fabio Porta, eleito deputado no Parlamento italiano para a jurisdição da América do Sul, e o deputado Eros Biondini, deputado em Brasília, comentaram como uma visão conjunta e um canal aberto entre as esferas de poder de Brasil e Itália podem facilitar a cooperação jurídica e garantir o exercício dos direitos de cidadania dos brasileiros residentes no país.

O painel inicial teve como foco a crescente violência de gênero, fenômeno que, para ser combatido, exige uma estratégia de proteção social sistêmica, que envolva não só delegacias, o poder judiciário, os serviços sanitário e de assistência social.

“Em um país ainda permeado por uma forte cultura machista e que normaliza comportamentos reprováveis, precisamos de um salto cultural para valorizar a integridade da pessoa, investir em campanhas de educação e prevenção primária”, declara Vittoria Doretti, responsável pelo projeto Rete Regionale Codice Rosa, que na região da Toscana está contribuindo para que novos casos de violência possam emergir e sejam oficialmente registrados.

Até a data desse artigo, na Itália aconteceram 122 casos de feminicídio, enquanto no Brasil a cada quatro minutos uma mulher é vítima de violência. Um drama que, como especifica a deputada italiana Sara Ferrari, também é indiretamente ligado a questões econômicas e a um gap salarial evidente na Itália.

Embaixada do Brasil em Roma

Edilene Giustini, coordenadora geral do Conselho de Cidadãos de Roma, conhece de perto a realidade da comunidade brasileira na capital, composta principalmente por mulheres. “Não é raro que entre as brasileiras enfrentem no exterior dificuldades como problemas ligados à guarda dos próprios filhos, chantagens econômicas e que tenham consciência sobre os próprios direitos e acesso à tutela legal”, explica. Por isso, a criação de uma rede de apoio é indispensável.

O segundo tema abordado durante o seminário, a questão carceraria e as medidas alternativas à prisão, também gerou diversas reflexões. Em ambos os países, é evidente o risco de um colapso do sistema carcerário. No Brasil, em 2000 a população de encarcerados era de aproximadamente 230 mil pessoas, enquanto em 2023 ela chegou a 830 mil.

Se um dos “termômetros” de uma democracia madura e do estado de direito é a postura de um Estado diante de crises e a sua capacidade de promover políticas que fortaleçam alternativas penais socioeducativas que respeite a dignidade humana, valor alicerçado na Constituição, Itália e Brasil discutem sobre os efeitos estigmatizantes de uma condenação e sobre a reinserção no mercado de trabalho como única possibilidade de subtrair um prisioneiro do crime organizado.

Alguns dos casos citados no seminário são a APAC de Itaúna, em Minas Gerais, considerada um modelo na recuperação de presos, e o projeto da cooperativa Giotto, que em Padova oferece trabalho aos prisioneiros.

Ainda sobre esse tema, a deputada Debora Serrachiani lembra, dramaticamente, que em 2024 a Itália já registrou o suicídio de 32 pessoas em suas prisões e que existe o risco que uma mudança no código penal italiano anule a possibilidade de adiar o processo a mulheres ou mães com filhos de até um ano de idade.

Embaixada do Brasil em Roma

O último painel do seminário foi dedicado às parcerias comerciais entre Brasil e Itália. Roberto Panzarani, professor da UFRJ e da Università Cattolica di Roma, explica que existe uma similaridade entre o sistema industrial brasileiro e aquele italiano, compostos, em mais de 90%, por micro e pequenas empresas com gestão familiar.

Para facilitar eventuais acordos comerciais, ele acredita que primeiro é preciso investir em uma troca cultural e garantir um sistema de direitos sólido, capaz de atrair investimentos internacionais.

Se o ecosistema do made in Italy conseguiu conquistar mercados estrangeiros investindo em valores intangíveis como o genius loci italiano, o Brasil detém um grande know how técnico, científico e humano, como o Parco Tecnológico da Bahia, que pode e deve ser divulgado para o mundo”, conclui.

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