Liberdade de imprensa na Itália: é proibido proibir?
Hoje é o Dia Internacional da Liberdade de Imprensa e como jornalista titular de um prêmio por uma tese dedicado a Anna Politkovskaja, profissional assassinada por ter coberto a guerra na Tchetchénia e pelas críticas ao governo de Putin, não poderia deixar de comentar o cenário italiano.
Exílio forçado, censura e perseguição são violações de direitos fundamentais que não costumamos associar a países altamente industrializados e com democracia consolidada.
À primeira vista, a 77° posição ocupada pela Itália no ranking de Reporters Sans Frontières (RSF) com um balanço sobre a liberdade de imprensa pode parecer um anacronismo.
Entre os 180 países analisados, nações nas quais aparentemente a independência dos jornalistas é colocada em risco – como a Nicarágua, Botswana e a Armênia – apresentam situações menos críticas que aquela italiana.
A ONG atribui a cada país uma nota definida de acordo com variáveis quantitativas como a percentual de jornalistas detidos, mortos, exiliados, sequestrados, agredidos ou censurados enquanto exerciam a profissão, e dados mais delicados como o grau de autocensura dos veículos de informação ou a interferência de instituições em conteúdos editoriais.
Os resultados do relatório de Reporters Sans Frontières são alarmantes e retificam aquilo que salta aos olhos dos italianos.
Entre os países membros da União Europeia, somente Cipro, Grécia e Bulgária apresentam situações mais dramáticas que aquela da Itália.
Segundo o documento da ONG, entre 30 e 50 jornalistas italianos são protegidos pela polícia local porque vítimas de ameaças.
Os casos mais emblematicos são aqueles de Roberto Saviano, autor do best-seller Gomorra ameaçado pela máfia e residente em New York, e aquele dos jornalistas Gianluigi Nuzzi e Emiliano Fittipaldi, escritores que podem ser condenados pela justiça vaticana porque acusados de roubo e divulgação de documentos confidenciais.
Esses são somente algumas das situações sob os holofotes da mídia mundial.
No entanto, o cotidiano de muitos jornalistas italianos, principalmente aqueles de publicações locais, muito ligadas a territorios dominados pela máfia, é feito de intimidações e ameaças diárias.
Na mídia mainstream a situação é diferente e na TV de estado, a RAI, historicamente sempre existiriam nomeações políticas, principalmente no que refere-se a cargos de prestígio.
De acordo com a lei atualmente em vigor, entre os sete conselheiros da TV pública, dois são nomeados pelo governo, dois pela Câmera, outros dois pelo Senado e um é o representante dos funcionários da RAI. Antigamente, o Conselho era formado por 9 membros: sete escolhidos pelo Parlamento e dois pelo Ministério das Finanças.
Na RAI existem poucos bons programas de jornalismo investigativo e os profissionais que ousam investigar questões críticas como a apresentadora do programa Report (RAI 3), Milena Gabanelli, são frequentemente processados (e até agora sempre absolvidos) por calúnia e difamação.
A agenda dos principais telejornais é fortemente caracterizada pelas notícias da política e o vértice de instituições como a igreja católica podem condicionar o debate sobre temas mais polêmicos, como a recente discussão sobre um projeto de lei para formalizar a união civil.
Outra situação delicada na Itália é o fato que grandes conglomerados editoriais são, direta ou indiretamente, ligados a grupos industriais ou a personalidades com significativa influência política.
Apesar do país possuir uma lei em matéria de conflito de interesses, o risco de ingerência no pluralismo da informação e na completa liberdade de imprensa é real.
No que refere-se à Internet, a Itália festejou recentemente 30 anos de acesso á rede mundial de computadores e está investindo fortemente para que a banda larga esteja disponível em todo o país.
Segundo os dados do relatório Audiweb Trends, em junho de 2015 cerca de 85,5% dos italianos declararam que navegam na Internet de qualquer lugar e usando diferentes tipos de dispositivo.
A liberdade de expressão é garantida na Constituição italiana mas para alguns intelectuais também tem aspectos negativos.
Durante uma cerimônia realizada na Universidade de Turim, Umberto Eco declarou polemicamente que as mídias sociais também dão voz a legiões de imbecis,; pessoas que antes só falavam no bar depois de um copo de vinho, sem prejudicar a coletividade, e que agora tem o mesmo direito de expressão de um Prêmio Nobel.
Pessoalmente, acredito que o importante é ter liberdade de escolha. Até para decidir o nível de aceitação da imbecilidade.