Itália vítima do colonialismo cultural e de clichês
Aqui não há botão que, uma vez apertado, mude rapidamente o estado das coisas.
A gente seca as roupas expondo as peças ao sol e ao vento. Dependemos da intensidade e da alquimia entre ambos.
Aqui não há jantar com massa caseira que se materialize magicamente na mesa. Precisamos sujar as mãos de ovos e farinha.
Aqui não há música sem melodia. Não há ária de uma ópera sem sentimento.
Aqui não há monumento sem projetação. Não há cúpula sem esboços, cálculos.
Aqui não há arte sem experimentação e sem mecenas.
Aqui não há gênio sem tormento.
Não há design sem mentes livres.
Não há universidades históricas sem alimentar a dúvida.
Não há sítios arqueológicos sem valorizar o passado.
Aqui não há paisagem nem colinas cenográficas sem a ranhura do trator.
Aqui não há língua italiana sem amor. Nem Dante sem Beatrice.
Breve introdução para trazer até aqui uma polêmica dos últimos dias envolvendo a narração da Itália no exterior, principalmente na TV de países norte-americanos e o fenômeno que alguns definiram “colonialismo cultural”.
É comum insistir no uso de clichês que reduzem um país dinâmico e uma cultura mais que milenar sim, mas em contínuo movimento, a expressões como “dolce vita” ou a caricaturas que na verdade não representam a alma local.
Essa bolha criada – acredito involuntariamente- para gerar audiência facilmente, estimula potenciais viajantes a acreditar que a Itália não seja um país feito de gente de carne e osso, mas uma espécie de cartão postal.
Uma imagem estática, um cenário teatral onde roupas são penduradas no varal não por necessidade, mas para serem fotografadas por turistas. Onde pratos de massa chegam às mesas para viralizarem nas redes, sem que alguém tenha dedicado horas para preparar uma receita.
Se a Itália é o país com o maior número de sítios Unesco e detentora de patrimônios culturais imateriais, é porque esse saber não é artefato, construído para ser exibido ao mundo como folclore, mas fruto de uma identidade profunda que não aceita estereótipos.
O que acha a respeito?