O que fazer em Gênova, uma cidade de contrastes

Gênova, na região da Ligúria, é uma cidade italiana com um significado especial para mim. Aqui em casa somos fãs de Fabrizio De André, cantor e compositor genovês doc. Talvez pela semelhança de algumas palavras com o português – sua língua afetiva – mesmo sem conhecer o significado dos versos de Crêuza de Mä minha filha  cantava desde pequena o refrão dessa música.

Gênova também foi o lugar de onde partiam meus bisavós quando emigraram para o Brasil. Outra história. Outros tempos. No entanto, nesse período de fronteiras blindadas e de muros com ferpas, acredito que hoje o seu espírito aberto de cidade portuária e democrática deveria servir de exemplo para um processo de integração e abertura.

Ali nasceram o almirante Andrea Doria e o descobridor da América, Cristóvão Colombo, exploradores por excelência. Ali, a partir dosa nos 60, nasceu a chamada scuola genovese, o movimento cultural e artístico de ruptura com a música tradicional italiana.  Ali não há espaço para falsas aparências. Para modismos passageiros. Para meios termos.

Gênova não é dócil nem feita de linhas arquitetônicas regulares. Gênova é uma cidade de gênio forte e a sua grande personalidade pode catalisar olhares ou causar espanto. 

Gênova é a cidade dos caruggi (becos seculares) e, de dia, vagar entre as suas vielas é a melhor maneira de sentir o espírito da Superba, como é conhecida a capital da Ligúria, sede do mais importante porto comercial da Itália.

Marinheiros, turistas, imigrantes e prostitutas (que De Andrè, na música Via del Campo, chamava de Graziose) podem causar sujeição ou gerar uma atração irresistível. O que à primeira vista parecer destoar com a imagem de uma região famosa por refinados balneários costeiros cria uma cidade caleidoscópio de um mundo. Só Gênova poderia dedicar uma praça a Don Andrea Gallo, padre de rua, pacifista e partigiano, ou seja, adepto da Resistenza, o movimento armado contra o fascismo e à ocupação da Itália por parte da Alemanha nazista.

Vagando pelo centro antigo você cruza com botteghe storiche (lojas históricas), atividades que resistem ao tempo como a pequena Barbearia Giacalone, sente o calor e o perfume das focaccerie como o Panificio Mario (Via san Vincenzo, 61), do peixe frito com “udù de bun”(cheiro bom).

Você encanta-se com  docerias como a Pasticceria e Liquoreria Marescotti di Cavo (Via di Fossatello, 35r), Romanengo (Via Roma, 51) ou Klainguti, local de 1828 amado por ninguém menos que Giuseppe Verdi.

Muita gente acredita que genovês é sinônimo de mugugno, de reclamações, mas na cidade encontrei pessoas abertas e orgulhosas de sua cidade. Bastou pedir indicações de como chegar até a Via del Campo para jogar conversa fora e ser acompanhada pessoalmente até lá.

Nessa rua  fica ViadelCampo29rosso, um espaço dedicado à memória de Fabrizio De Andrè. Nesse beco, entre roupas estendidas no varal e aroma de frito no ar sobrevivem as notas musicais do compositor genovês.

A elegância de Gênova também está na arquitetura dos Palazzi dei Rolli, os 42 palácios históricos que já no século XVI eram residência de famílias nobres ou serviam para hospedar personagens ilustres que visitavam a cidade. Hoje as construções são tuteladas pela Unesco e alguns deles funcionam como sede de instituições, bancos ou outras atividades.

A área protegida pela Unesco inclui Via Lomellini, Piazza Fossatello, Via San Luca e Piazza Banchi e Via Garibaldi, onde concentram-se vários Palazzi dei Rolli. Percorrendo essa rua (no passado Strada Nuova ou Via Aurea) você cruzará com imponentes edifícios. Muitos não são abertos ao público, mas não deixe de conferir pelo menos o Palazzo Tursi – Niccolò Grimadi (Via Garibaldi, 9), sede da prefeitura, e o Palazzo Niccolosio Lomellino (Via Garibaldi, 7), repleto de afrescos e  um jardim interno abertos para visitação com agendamento prévio nos primeiros sábados do mês, das 10h às 18h. Os ingressos custam 8 euros e as reservas podem ser feitas enviando um e-mail para info@palazzolomellino.org

Em Gênova o protagonista é o mar e a origem de sua riqueza: o porto. Um dos símbolos mais emblemáticos de seu passado como potência naval é a Lanterna, o farol restaurado em 1543.

Além do belíssismo Palazzo San Giorgio, um dos mais importantes da cidade,  área ao redor do porto tornou-se um polo turístico importante depois de reformas realizadas na década de 90 e também em 2001.

Esse foi o período quando o arquiteto Renzo Piano assinou várias obras icônicas de Gênova como a Biosfera, um globo de vidro e aço que abriga uma floresta tropical e o Bigo, o elevador panorâmico do porto.

Renzo Piano e Gênova representam uma combinação indissolúvel. Sua ligação com a cidade é fortíssima e foi ele que apresentou voluntariamente um projeto de reconstrução da Ponte Morandi. Os arredores do porto também reúnem atrações imperdíveis para as crianças como o Aquário de Gênova ou o Galeone Neptune, a perfeita reprodução de um navio de época construído em 1986, na Tunísia.

Para descobrir outro lado da cidade, percorrendo a movimentada área dos pórticos de Sottoripa você chega até a Cattedrale di San Lorenzo (de 1100), que mescla o gótico e o românico e impressiona por sua fachada listrada e pelos leões de mármore que vigiam a sua escadaria.

De lá siga até o Palazzo Ducale, antiga casa dos Doges de Gênova e hoje centro cultural e artístico e caminhe até a Piazza Raffaele De Ferrari, coração da cidade com sua cenográfica fonte, e percorra as lojas das ruas Via XX Settembre, Via Dante e Via Roma.

No final do dia, escolha entre um passeio até Bocadasse um antigo burgo de pescadores onde o tempo parece ter parado e Piazza delle Erbe, o lugar ideal para um happy hour. O ar com perfume de maresia e uma boa companhia completam qualquer programa em Gênova.

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