Otranto, a base ideal para descobrir as joias do Salento, na Puglia.

Eu definiria a Puglia uma terra plural. Entre as regiões do sul da Itália (excluindo as ilhas) ela é aquela mais extensa e com um dos litorais mais amplos. Do Gargano, no norte, até a sua extremidade sul, em Santa Maria di Leuca, o turista encontra uma ampla variedade de paisagens, dialetos, cores e sabores.

Otranto, no Salento – que graças a sua posição geográfica é a primeira cidade italiana a contemplar o nascer do sol – é a máxima expressão de sua colonização grega. O próprio nome da cidade deriva de duas palavras gregas que significam “água” e “monte”.

Entre o mar Adriático e Jônio, ela sempre foi um elo com o Oriente. Acolheu civilizações pré-históricas como aquela dos Messapi e dos Pelasgi, povos como os bizantinos, os normandos e os aragoneses.

Em tempos mais recentes, continuou acolhendo outras culturas, mesmo em momentos trágicos. Em 1997, o chamado Canal de Otranto, que divide Punta Palascia, na Itália, de Punta Linguetta, na Albânia, foi palco de um dramático naufrágio que provocou a morte de 81 imigrantes.

à esquerda, obra de Costas Varotsos

Se você visitar Otranto, nos arredores do porto notará uma instalação artística de Costas Varotsos. Intitulada “O desembarque. Obra para a humanidade migrante”, ela relembra as vítimas dessa tragédia coletiva e foi criada utilizando os destroços do navio albanês Kater I Rades.

Localizada cerca de 50 quilômetros de Lecce, Otranto é uma ótima base para explorar o Salento, suas praias e seus outros tesouros naturais e artísticos.

Ela integra a lista dos “borghi più belli d’Italia”e chegando lá você vai notar que se trata de uma cidade fortificada. Isso porque ela prosperou e corria o risco de invasões e ameaças. Seu castelo foi contruído a partir de 1485 mas os muros que circundam a cidade não foram suficientes para defendê-la de um dos ataques mais cruéis da história do Cristianismo; aquele do exército turco otomano composto por 260 mil homens.

Depois de conquistar Bizâncio, considerada a “segunda Roma”, o líder islâmico Maomé II almejava invadir a “primeira Roma”, a capital do cristianismo. O perigo era real e o Papa da época, Sisto IV, chegou a pensar a mudar-se para Avinhão para proteger-se dos ataques otomanos.

Outro objetivo dos otomanos era a ilha de Rodes e durante a sua rota naval o exército turco otomano invadiu a frágil cidade de Otranto. Eles desembarcam em uma praia que até hoje  chamada de Baia dei Turchi. Assassinaram quase toda a população.

Baia dei Turchi

Somente 800 sobreviventes aos ataques se refugiram dentro da catedral de Otranto, invadida em seguida pelo exército inimigo. Todos foram acompanhados até o chamado Colle della Minerva e, recusando-se a renegar o nome de Cristo e a converter-se ao Islamismo, foram decapitados.

Catedral de Otranto

Em homenagem às vítimas foi erguida a igreja de Santa Maria dei Martiri e todas foram canonizados como santos mártires em 2013 pelo papa Ratzinger. Ele havia anunciado o 12 de maio como a data de canonização no mesmo dia que comunciou ao mundo que abdicava do papado.

As relíquias dos santos que não tem um nome, mas representam uma população inteira, ficam em sete armários situados na Capella dei Martiri, na catedral de Otranto.

Impossível não ficar boquiaberto diante de sua pavimentação recoberta por mosaicos realizados entre 1163 e 1165. Não deixe de observar a figura da  bênção com a mão “grega”. Na iconografia ortodoxa grega, o gesto da mão de bênção reproduz as letras IC XC, uma abreviação das palavras gregas Jesus (IHCOYC) Cristo (XPICTOC), que inclui a primeira e a última letra de cada palavra.

Os mosaicos também ilustram o inferno e o paraíso, mas não o purgatório porque naquele momento histórico igreja ainda não havia criado as indulgências para as almas do purgatório.

A cidade também conserva uma igreja com alguns dos afrescos bizantinos mais fascinantes do Salento, a Basilica de San Pietro, mas você também deve reservar tempo para explorar as lojas e artigos de artesanato do Corso Garibaldi, fotografar a Piazza del Popolo e a sua Torre dell’Orologio, admirar peças de cerâmica ou degustar um pasticiotto na Pasticceria Alessandro Merola.

Praias nos arredores

Otranto pode ser uma ótima base para conhecer algumas das praias mais belas do Salento. E garanto que são tantas.

Aquelas mais urbanas são Cala dei Normanni e a spiaggia degli Idruntini, mas se você não é o tipo que prefere praias com quiosques e espreguiçadeiras, mas gosta de praias mais selvagens, sugiro que conheça a Baia delle Orte. Basta escolher uma faixa de areia entre as rochas e entrar na água, limpíssima. O lugar também é ideal para quem curte mergulho ou snorkeling, ou então Grotta Monaca.

Baia di Santo Stefano

Outros lugares imperdíveis são a Grotta della Poesia (a menos de 30km de Otranto), considerada uma das piscinas naturais mais belas do mundo, Torre Sant’Andrea, com suas águas com diversos tons de azul turquesa e picos rochosos, a Baia di Santo Stefano, onde pescadores e um mar azul inenso criam um cenário único, e a praia mais movimentada, conhecida como Baia dei Turchi. Para chegar lá você percorre um bosque.

Torre Sant’Andrea

Outra opção é a zona dos Lagos Alimini, espelhos d’água perto do mar e circundados de pinheiros. Para encontrar dunas, vá até a Baia del Sole.

Pedreira de bauxita, atração imperdível

Bem pertinho de Otranto, não perca a chance de visitar a pedreira de Bauxita que  nos dá a sensação de estar em um planeta como Marte, principalmente se você visitar esse lugar no final da tarde, com o por  do sol.

Guia ambiental explica as peculiaridades da pedreira

A bauxita é um dos elementos fundamentais para a produção do alumínio e como contém óxidos e hidróxidos de alumínio e ferro a cor da pedreira lembra a ferrugem.

Quando as atividades comerciais de extração da bauxita foram encerradas, resíduos se  infiltraram no lençol freático criando um lago de cor verde esmeralda que contrasta com a cor de ferrugem, criando um efeito cenográfico.

Para aproveitar ao máximo o passeio, a minha sugestão é que você contrate um guia ambiental que te acompanhe pela pedreira e, em seguida, até o farol de Punta Palascia.

O farol que é um símbolo

Da pedreira seguimos caminhando em meio à natureza até o farol de Punta Palascia, na parte do extremo leste do território italiano, no chamado Capo d’Otranto, a somente 72 quilômetros de distância da Albânia. Nessa posição, observando a imensidão do horizonte, a vocação hospitaleira e de acolhimento dessa terra é ainda mais evidente.

O percurso para chegar até o farol de Punta Palascia

Onde ficar em Otranto

Para explorar a cidade de Otranto e os seus arredores, não perca a chance de hospedar-se em uma típica masseria pugliese. Essas antigas fazendas destinadas à produção agrícola foram transformadas em refinadas estruturas hoteleiras, mas sem perder suas originais características arquitetônicas.

Eu me hospedei na elegante Masseria Montelauro, com quartos amplos, piscina, excelente oferta gastronômica e ótima localização.

Para saber mais sobre a Puglia assista os vídeos:

Fasano, o luxo da simplicidade e a terra das masserias na Puglia 

O que fazer na Puglia no sul da Itália. Dicas para explorar a região com os cinco sentidos.