Somos permeáveis a opiniões discordantes no Brasil e na Itália?
Olhando o próprio umbigo. Ou, em outras palavras, todos nós somos vítimas do “viés de confirmação”.
Vivemos na época da desinformação e, com a difusão da inteligência artificial, fica cada vez mais difícil distinguir fatos reais de fake news.
Nesse cenário, a legitimidade do jornalismo de investigação e dos métodos utilizados pelos jornalistas para trazer verdades à tona é continuamente colocada em discussão.
Duas notícias recentes me fizeram pensar em quanto a nossa identidade nacional e nosso sentimento de patriotismo influenciem nossa percepção da realidade.
A primeira li em um grande jornal italiano (com o qual já colaborei) com o título “Brasile, a rischio il mito della spiaggia libera”. O artigo comenta a possibilidade que, graças a uma emenda constitucional, o Brasil adote um novo sistema de controle da costa brasileira, até agora pertencentes à União. As palavras eram de críticas à provável privatização de áreas de praia.
A segunda notícia foi a matéria de uma jornalista americana associando a região da Puglia, que hospeda o G7, à uma terra de infiltração mafiosa e de crescentes índices de criminalidade. O artigo publicado ontem provocou a ira do vértice da política italiana. Para o governo, um dano injusto à imagem local.
Como brasileiros ou como italianos (porque escrevo sobre essas duas porções de mundo) nos sentimos os únicos cidadãos autorizados a criticar ou a apontar os defeitos de nosso próprio país.
Um olhar externo e estrangeiro é quase sempre associado à desconfiança, à imprecisão, à incapacidade de principiantes de interpretar uma nação diferente da sua.
Analistas internacionais costumam ser sinônimo de condicionamentos externos, de jogos de poder e confesso que eu mesma quando leio na mídia estrangeira alguma notícia negativa sobre o Brasil fico incomodada.
No caso do artigo americano publicado durante o G7, muitos afirmam que não seria oportuno divulgar exatamente agora esse tipo de matéria, mas quanto cada um de nós é capaz de fazer uma análise imparcial e objetiva do próprio país, sem recorrer à validação duvidosa de nossos próprios esquemas mentais?
Já ouviram falar do chamado viés do inconsciente? Essa teoria afirma, em poucas palavras, que nosso cérebro é preguiçoso. É preciso muito esforço cognitivo para não adotar sempre os mesmos atalhos mentais.
Como somos expostos a uma sobrecarga contínua de informações, a nossa tendência é observar apenas partes do mundo, aquilo que nos é familiar e confirma aquilo em que já acreditamos, em vez de alterar nossa mentalidade, preparando-a para incorporar novas informações.
Nós também tiramos nossas conclusões já pensando, inconscientemente, em replicar uma versão da realidade na qual queremos implicitamente acreditar.
Pelo jeito, não somos permeáveis a opiniões discordantes e noto isso, inclusive, quando um brasileiro residente no exterior ousa comentar em redes sociais algum fato relacionado ao próprio país. Quase sempre, com a sua mudança é como se não fosse mais legitimidade a exprimir qualquer parecer.
Sem filtros, gostaria de saber se você também já se sentiu incomodado ao ver seu próprio país criticado.
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