Passeio grátis em Trastevere: per grazia ricevuta
Passear a pé pelas ruas de Roma é a melhor maneira de observar detalhes que, de carro ou da janela de um ônibus, poderiam passar despercebidos.
Vocês já notaram quantos oratórios, imagens sacras e santuários existem na arquitetura da cidade eterna?
O último estudo estatístico registrou, só nos distritos do centro histórico, a presença de 522 santuários.
Emblemas da devoção religiosa popular, esses espaços sagrados são chamados edicole sacre e podem ser considerados obras de arte e elementos de design urbano.
Geralmente, esses quiosques ou nichos localizam-se em muros, podem ser mais ou menos vistosos e realizados com diferentes materiais como afrescos, estuque, tijolos, mármore, azulejos e terracota, entre outros.
Em Roma, por exemplo, é fácil cruzar com imagens sacras e santuários na forma de um medalhão circundado por estuques e querubins.
Mesmo para quem não é religioso, é curioso observá-los porque representam parte da cultura popular italiana.
Alguns deles, inclusive, são de autoria de artistas consagrados como Antonio da Sangallo, il Giovane.
Graças à encomenda de um tabelião da Câmara Apostólica, ele construiu, por volta de 1523, a edicola sacra mais antiga da capital.
Chamada Immagine di Ponte e situada na histórica Via dei Coronari, esse santuário possui uma imagem da Incoronazione della Vergine realizada por Perin del Vaga.
Historicamente, muitos oratórios foram construídos nos séculos XVII e XVIII e, naquela época, garantiam a iluminação noturna das cidades italianas. Outros foram erguidos durante e logo após a Segunda Guerra Mundial, principalmente nas periferias, porque considerados forma de proteção.
Sugiro que quem passear pelo bairro de Trastevere chegue até Viale Trastevere, mais ou menos na altura do número 143, diante do grande edifício do Ministério da Educação, chamado de Ministero dell´Istruzione, dell´Università e della Ricerca (MIUR).
Ali você encontrará uma edicola sacra e um muro repleto de dedicatórias, aquelas que os italianos chamam de per grazia ricevuta (por graça recebida).
Construído em 1944 – em pleno período de guerra – por Arrigo Minerbi, um escultor de origem judaica, o santuário foi dedicado a um sacerdote franciscano que dedicou-se a crianças órfãs.
Por esse motivo, a imagem desse nicho sagrado representa a Madonna degli Orfani e no muro você verá uma fissura com a escrita pane agli orfani (pães aos órfãos).
O murou de quase 30 metros quadrados é inteiramente recoberto por agradecimentos de todos os tipos e lendo cada um deles a imaginação corre solta, pensando nas vidas por trás daquelas palavras.