Sexto Sentido

Turismo de raízes. Identidade italiana se reforça na cozinha

Receita de família. O que une, mais do que tudo, italianos e descendentes com a própria pátria?

Quando o tenor Enrico Caruso encerrava os seus shows no Metropolitan Opera House, em New York, ia direto ao restaurante Grotta Azzurra para devorar um prato de spaghetti al pomodoro. Muitos dos italianos que emigraram pelos quatro cantos do mundo não sabiam ler nem escrever, mas esbanjavam talento culinário.

Assim se propagaram os valores daquela que, não por caso, em 1975, foi chamada pela primeira vez, por um americano, de “dieta mediterrânea”. Naquele momento, o estudioso Ancel Keys não sabia que em 2010 aquele modelo alimentar seria declarado patrimônio imaterial da humanidade pela Unesco. Keys também foi o idealizador da ração K, a porção individual de comida entregue aos soldados do exército americano durante a Segunda Guerra Mundial.

Alimentação para os italianos é sinônimo de casa e assume um significado ainda mais acentuado no caso daqueles que partiram, mas que sentiam a necessidade de manter uma ligação com as próprias raízes.

Basta pensar que a própria etimologia da palavra “dieta”, do grego diaita, indica “modo de viver”, mas também “moradia”.

No Brasil ou nos Estados Unidos da América, assim como em outros países que acolheram emigrantes, a culinária italiana é um híbrido. Em alguns casos, se adaptou aos gostos locais. Por isso, pratos como o famoso “spaghetti with meatballs”, o nosso bife à parmigiana ou ainda palha italiana não são considerados realmente autênticos ícones da cozinha italiana.

Até pouco tempo atrás, essas invenções gastronômicas eram esnobadas pela maior parte dos críticos gastronomicos mais dogmáticos. Hoje, esse modelo se reverte.

Peperone Crusco é um dos produtos da gastronomia da Basilicata

Nos ultimos dias 20 e 21 de novembro, a cidade de Matera, no sul da Itália, foi palco da segunda edição de Roots in (Fórum Internacional do Turismo de Origem), o primeiro evento italiano totalmente dedicado ao chamado Turismo de Raízes, tema que em 2024 será protagonista na campanha de promoção turística da Itália no exterior.

Assim como Francis Ford Coppola, que voltou à Bernalda, na Basilicata, para conhecer a terra de seu avô Agostino e acabou transformando um edifício histórico em um resort de luxo,  é cada vez maior o número de descendetes de italianos espalhados pelo mundo inetressados em conhecer as suas origens.

O encontro organizado pela Região da Basilicata, em colaboração com a Agência Nacional de Turismo (ENIT) e com o apoio do Ministério das Relações Exteriores, reuniu representantes de regiões italianas e 18 operadoras de turismo brasileiros.

O Brasil, assim, como a Argentina, é uma das nações que mais acolheram emigrantes italianos e, por concentrar grande número de “oriundi”, é um mercado chave para a Itália.

Durante Roots In, no debate intitulado “A cozinha da memória: a comida como elemento de identidade cultural capaz de atrair o turista de raízes”, Elisabetta Moro, professora de Antropologia Cultural da Università Suor Orsola Benicasa, de Nápoles, sublinhou que  “a culinária de raízes” é um patrimônio que não deve deixar de ser valorizado por ter sofrido adapatções ou contaminações culturais. “Lembrando uma frase do histórico Massimo Montanari, não existe prato típico que não seja fruto do compartilhamento”, diz.

Um exemplo dessa cozinha plural é outro convidado de Roots In: Donato de Santis, chef de origem italiana que já foi o cozinheiro particular de Gianni Versace e hoje é um dos mais amados na Argentina.

Ele vive no país desde 2000 ali conquistou ainda mais popularidade como juíz de Mastechef e preprarando receitas que os argentinos conheciam graças as histórias contadas pelos próprios avós ou bisavós. Ele também é o proprietário do primeiro restaurante 100% gluten free da Argentina.

Hoje, esse patrimônio imenso é reunido no Museo Virtuale della Dieta Mediterranea (https://mediterraneandietvm.com/), que inclusive reúne entrevistas com italianos centenários, provavelmente graças à própria alimentação, estilo de vida e ligação com a própria terra. Porque para os italianos que vivem na Itália ou no exterior, comida também é sentimento.

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