O que a venda das Havaianas assinadas por Dolce &Gabbana nos ensina sobre a Itália e o consumo consciente
O burburinho causado pela parceria entre duas grandes marcas – Dolce & Gabbana e Havaianas – e as filas nos shoppings para comprar os modelos lançados por essa collab confirmam a minha teoria que não só na moda, mas em outros setores como a enogastronomia e o turismo, a “Itália” é um brand de grande reputação.
Até aqui nada de novo, mas será que todos os consumidores ávidos pelo made in Italy ou faz do Italian way of life compram conscientemente, compreendendo o valor não só monetário, mas simbólico de seus objetos do desejo? Ou a compra compulsiva é movida principalmente pelo “status” gerado por possuir um objeto italiano?
No caso dos chinelos, a ideia de marketing é ótima: unir o lifestyle brasileiro à criatividade da alta moda italiana.
Se você estiver com viagem programada para a Itália e passar por Milão, sugiro que visite a mostra “Dal Cuore alle Mani: Dolce&Gabbana”, que acontece até julho no Palazzo Reale. Não é um evento indicado só para quem é fashion addicted porque evidencia as influências culturais da longa e renomada carreira de Stefano Dolce e Domenico Gabbana.
No Brasil, os modelos limited edition lançados pelas Havaianas esgotaram-se em menos de 24 horas, mas acompanhando as discussões nas redes sociais sobre a estética das estampas dos chinelos, algo chamou a minha atenção.
Muitos daqueles que admitiram ter comprado as Havaianas azul e vermelha fizeram declarações como “mesmo a estampa sendo brega ou cafona”, “mesmo a estampa parecendo o desenho de um circo”. Deduzo que compraram porque o modelo foi “assinado” pelos estilistas Dolce e Gabbana, mas sem ter noção do que ele representa.
Entre os quatro modelos, um deles representa o “carretto siciliano”. Domenico Dolce nasceu na Sicília (em Polizzi Generosa, Palermo) e a sua terra de origem sempre inspirou diversas coleções da marca Dolce e Gabbana.
O carretto siciliano é uma tradicional carroça da Sicília famosa por sua ornamentação e importância cultural. São carros de madeira habilmente esculpidos e pintados por artesão locais com cores vibrantes, representando cenas de história, folclore e religião dessa que é uma ilha, mas também a maior região da Itália: a Sicília.
Sua estrutura é robusta para suportar cargas pesadas e suas rodas são grandes e muitas vezes reforçadas com metal para garantir a sua durabilidade.
Originalmente, os carretti siciliani eram usados para transportar mercadorias, como alimentos, vinhos e outros produtos através dos povoados da Sicília, mas atualmente são vistos em festas, e celebrações culturais.
Sem dúvidas, são um símbolo do orgulho e da identidade siciliana, que provavelmente nem todos os consumidores dos chinelos com a estampa que os representa conhece.
Algo similar também acontece no setor da enogastronomia italiano, um nicho de mercado imitado com frequência no exterior através do fenômeno do Italian Sounding. Se trata de produtos cujo nomes evocam ou fazem alusão à Itália, mas de italiano não têm nada.
O consumidor que não se informa ou conhece a origem dos produtos italianos é induzido a pensar que se trata de algo “made in Italy”, que é sempre um valor agregado.
O conhecimento também faz toda a diferença durante uma viagem para a Itália. Já ouvi estrangeiros comentando que o vinho fragolino (uma variedade de uva também conhecida como uva americana) é realizado com morangos. Fragola, em italiano quer dizer morango e esse vinho não pode ser comercializado na Europa porque a legislação vigente quer proteger e valorizar as variedades autóctones.
No setor do turismo, ouvi visitantes se perguntando por que não se cobria o teto da Abadia de San Galgano, na Toscana.
Usando uma metáfora, sem informação o risco é que o cliente compre gato por lebre.
Comprar sem consciência é inofensivo, mas comprar conhecendo a história de um produto faz você apreciar ainda mais o seu valor.
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